lollipop-moments
“Lollipop moments”: Fazendo a diferença
16/08/2018
lideranca-e-gerencia
Liderar X Gerenciar
16/08/2018
Exibir tudo

Só acontece comigo

so-acontece-comigo

Acho que algumas coisas só acontecem comigo mesmo.

Pelo menos essa é a sensação que tenho. Acho pouco provável que outras pessoas tenham histórias ou experiências tão desastrosas como algumas que tenho vivenciado.

Vou começar com um caso que reflete a hipocrisia humana. Eu estava fazendo um processo de recolocação (outplacement) com uma empresa especializada. Como parte desse processo, essa empresa promovia de tempos em tempos um happy hour reunindo clientes já recolocados, alguns players de RH e, claro, os que estavam no processo de recolocação. O objetivo era fazer um networking e, com sorte, até se reinserir no mercado de trabalho.

Nesses eventos, descobri que só eu havia sido demitido, pois tirando os profissionais recolocados e os players de RH, todos os outros estavam fazendo um ano sabático, prospectando novos negócios, analisando o mercado ou pensando em abrir uma franquia, etc. O único demitido e desempregado era eu.

Para piorar aos poucos o quadro geral, vou contar sobre as duas retropromoções que tive. Você leu direito. A palavra retropromoção, que você não encontrará na Wikipédia, significa que a pessoa, depois de ser designada para um cargo mais elevado, é recolocada por alguém, ou alguma força obscura, no cargo anterior.

A primeira vez ocorreu quando eu era coordenador de RH e fui promovido pelo meu chefe, o gerente de RH, ao cargo de supervisor de RH, devido aos relevantes serviços prestados para a empresa. No mesmo período em que ele me promoveu, ocorreu uma mudança organizacional e ele foi transferido para uma área fora do RH. O gerente convidado para assumir o cargo, ao saber que minha promoção estava sendo processada, solicitou que eu não mudasse de cargo, pois não me conhecia bem; preferia assumir e, só depois de conhecer a estrutura, indicar as alterações que julgasse necessárias.

Pela primeira vez vi minha promoção, que havia sido assinada por todos, ser literalmente rasgada! O novo gerente nunca mais reconsiderou meu caso.

Como desgraça pouca é bobagem, e para provar aos incrédulos que um maldito raio pode cair, sim, duas vezes no mesmo lugar, em outro momento da minha carreira e em outra empresa, fui promovido a diretor de RH – Divisão Supply Chain Latam. A bem da verdade, só iria regularizar uma situação que já existia havia algum tempo. A diferença seriam o cargo, a remuneração e uma certa soberba, se é que vocês me entendem…

O processo havia sido complexo. Passei por avaliações, entrevistas e cheguei a receber a caixinha com os cartões comerciais com o novo cargo, feitos na matriz com papel reciclável, em inglês de um lado e português do outro. Porém – sempre há um, porém… –, meu chefe direto, que havia pedido minha promoção, deixou a organização por motivos misteriosos exatamente no mês do processamento da minha movimentação de pessoal.

Imediatamente, meu chefe oversea me ligou informando que estava havendo uma reestruturação, a nossa geografia estava recebendo um downgrade (rebaixamento) e não teria mais vice-presidente Latam, mas um “plant manager Latam”. E, com isso, eu tinha duas opções: esquecer minha promoção e continuar na organização ou ser demitido com o cargo de diretor de RH Latam.

Você deve saber a minha resposta por motivos óbvios. Tirando o prejuízo financeiro, só um pequeno arranhão nos meus 1,92 m de autoestima…. Nada a que eu não sobrevivesse.

E você? Já foi demitido pela mulher do seu chefe fora da empresa e na frente de todo o staffda companhia? Você não viveu emoções!!!

O pessoal de Marketing da matriz enviou ao meu chefe, que era O CHEFE, um convite para receber o “Prêmio de Excelência Empresarial”. Deslumbrado, ele me colocou em contato com o pessoal de Marketing para seguir com as tratativas.

Na minha análise, achei aquele prêmio bastante estranho. Cheirava a falcatrua. Não consegui nenhuma referência sobre ele nem a lista de vencedores dos anos anteriores.

Informei-o das minhas preocupações quanto à relevância do prêmio e à falta de referências dos organizadores. Ele ouviu, achou que eu estava vendo fantasmas onde não havia e mandou que eu seguisse com o evento.

Convidei todo o staff com os respectivos cônjuges para o grande momento de comemoração pelo recebimento do prêmio, uma justa homenagem aos nossos esforços!

No dia do evento, fomos a uma badalada casa noturna de shows da região. Meu chefe de fraque, sua esposa, dama da sociedade, vestida de longo, em alto estilo, toda emperiquitada.

Começou o mal-estar no serviço de coquetel, que era dos mais mequetrefes! Uísque Old Eight, coxinhas frias e com varizes, e por aí afora. Tirando a nossa indumentária, nada parecido a um evento de gala.

Aos poucos, lenta e mortalmente, meus temores estavam se confirmando.

Quando começou a premiação, a desgraça se confirmou por completo. A empresa vencedora no item ideia original era a “Zezinho sem Eira nem Beira e Associados”. Subiu no palco o diretor, usando botas, calça jeans, camisa social e um blazer com cotovelo de couro.

A mulher do meu chefe já estava tendo um chilique daqueles, falando cobras e lagartos do evento e creditando toda a desgraça e culpa na minha conta.

“Querido, proíbo você de descer do nosso camarote e receber esse prêmio ridículo, organizado por ‘este Zinho’ seu funcionário incompetente. Ferrou! Mande ele receber esse prêmio ridículo e depois me faça o favor de demiti-lo. ”

Quando o nome de nossa empresa foi chamado para receber o prêmio, entre alguns aplausos e apupos da esposa do meu chefe, fui eu lá para o palco. Para minha sorte, mesmo ela tendo muito poder, este ela não tinha: de me demitir. E para tristeza dela, não fui demitido. Meu chefe nunca mais tocou no assunto nem no troféu ganho.

[SL1]  Também fui protagonista de cenas de feitor, como admitir empregadas, motorista e jardineiro de expatriados. Levar para escolher casas em condomínios e supervisionar a mudança e a chegada dos móveis em casa de expatriados. Pegar filas na Polícia Federal para obter permissão de trabalho, fazer compras e mostrar os lugares aonde ir e aonde não ir, dar dura nos empregados domésticos, pagar e de vez em quando demiti-los.

Cuidei de funcionário da empresa preso no exterior a serviço, tive de negociar com ex-agentes da CIA e do FBI que integravam o time de segurança da matriz para a liberação do preso. Expliquei algumas idiossincrasias brasileiras e ouvi um monte de impropérios, como se eu tivesse causado o delito.

Como um último ato bastante pitoresco, fechei uma empresa e demiti os 180 funcionários restantes. Demiti meu chefe, com certa satisfação, meus pares, com resignação, e me demiti, com muita insatisfação.

Assinei minha carta de demissão como empregador e como empregado. Quem mais poderia me demitir, senão eu mesmo?

Do Livro -Crônicas de RH- Vol 2 .Os Psicopatas, O RH e Eu. www.clubedeautores.com.br